Como contratar para o setor de compliance?
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Como contratar para o setor de compliance?

Data da publicação: 14/03/2024
Por Luara A. Stollmeier

“Um setor não é feito de projetos e processos, e sim de pessoas”. Um dos principais jargões corporativos contém a realidade intransponível na hora de estruturar qualquer área: o processo de contratação de profissionais deve considerar uma série de fatores técnicos, comportamentais e éticos para que o projeto não fracasse.

Segundo pesquisa, estima-se que empresas perdem 5% do faturamento devido a fraudes.

Além disso, o custo com demissões pode chegar a 30% do orçamento anual de uma companhia.

Os desafios e dilemas com um setor de conformidade não são diferentes. Por isso, vamos expor os principais pontos no momento da contratação de profissionais para essa área, passando por:

  • O que faz um setor de compliance?
  • Quem (e como) contratar para o setor?
  • Cuidados especiais no momento da seleção

O que faz um setor de compliance?

Historicamente, o setor de conformidade dentro das empresas surgiu como uma resposta direta às sanções estatais em razão de escândalos de corrupção e fraude.

No Brasil, tivemos movimentos provocados por medidas legislativas, como a Lei 12.846/2013, e por meio de desdobramentos jurídicos causados por operações policiais. No decorrer dos anos, manuais e diretrizes para Programas de Integridade Corporativa foram lançados a fim de orientar sobre boas práticas em diferentes contextos (APEXBrasil, 2019; SEBRAE, 2016, 2017, CGU 2017; 2018).

As funções organizacionais de um setor de compliance continuam mantendo a companhia cumprindo regulamentações, legislações e normas obrigatórias e voluntárias, incluindo o Código de Ética e as políticas internas.

Em nossa pesquisa, quando perguntamos aos entrevistados (diretores, gerentes e consultores ligados à atividade de conformidade) quais eram suas atividades mais frequentes, as respostas foram:

Quando questionamos “quais áreas estão dentro do seu escopo de atuação?”, apenas 28% dos entrevistados indicaram o compliance como escopo único das suas atribuições. As áreas de privacidade de dados (35%) e auditoria interna (28%) aparecem com maior frequência como escopos agregados.

Atividades referentes a essas áreas podem estar, de fato, associadas a funções originais de compliance, como gestão de riscos e de mecanismos de controle interno.

Estruturação do setor de Compliance

Por um lado, vemos o Compliance se estruturando enquanto setor independente, em conformidade à premissa estabelecida no Decreto nº8.420/2015. Por outro, entendemos a complexidade da estruturação de um programa de Compliance e a pulverização de suas preocupações em outras áreas da companhia.

A definição das atribuições de um setor de compliance é influenciada pela realidade da corporação, sua estrutura organizacional, além de implicações do setor no qual ela atua, como determinados riscos financeiros, ambientais, reputacionais, entre outros.

Existem, ainda assim, modelos que inspiram a estruturação do setor a partir do ideal proposto por algumas instituições.

A Febabran, Federação Brasileira de Bancos, estabelece quatro atribuições principais do Compliance em uma empresa:

  • Consultoria, orientação, treinamento e capacitação;
  • Identificação, mensuração, priorização de riscos de compliance;
  • Monitoramento, testes e reporte;
  • Relacionamento com reguladores, autorreguladores, entidades de representação e auditores independentes.

Já o modelo inspirado pela “Declaração de posicionamento do IIA: as três linhas de defesa no gerenciamento eficaz de riscos e controles”, elaborado pelo Instituto dos Auditores Internos, propõe a segregação da gestão de riscos organizacionais em três linhas: execução, supervisão e avaliação.

Na primeira linha, concentram-se as ações de implementação de políticas e procedimentos internos de controle sobre as operações, ou seja, uma gestão centrada em atividades cotidianas.

Na segunda linha, a alta administração coordena, orienta e monitora as práticas implementadas pela operação. Na terceira linha, há a avaliação, que inclui auditoria interna.

Na prática, sabemos que a absorção efetiva de atribuições no setor é influenciada por um elemento crucial na gestão de um Programa de Integridade: as pessoas que nele atuam.

Como contratar para o setor de compliance?

Segundo levantamento, a maioria (61%) é composta entre 2 a 5 pessoas, seguido de equipes de 5 a 10 pessoas (19%). Em 11% dos casos, apenas uma pessoa é responsável pelas funções de compliance.

Ainda, nota-se a proximidade entre o setor de conformidade e os principais tomadores de decisão das companhias. Na pesquisa citada, 40% dos participantes afirmaram que o reporte de compliance é feito diretamente ao CEO ou presidente da empresa, enquanto outros 39% relataram que o reporte é feito para um comitê ou conselho.

Entendendo a relevância da área nas organizações, observamos que a composição do setor envolve uma responsabilidade extra e a habilidade de observar e entender diferentes áreas da empresa, sendo, em regra, formado por um líder (na função de Compliance Officer) que coordenada a parte operacional e responde a um CEO ou Conselho/Comitê.

Sendo assim, no momento de estruturar a composição de um setor de compliance, é interessante contar com um tomador de decisão e líder de setor e, um número de analistas (responsáveis pelas atividades operacionais) adequado à quantidade de colaboradores da companhia e suas demandas. As equipes podem ser formadas também por especialistas, assistentes e auditores.

Certificações para atuar no setor de Compliance

Durante o processo seletivo para formação da equipe de compliance deve se levar em conta as especificidades da área. Na avaliação de conhecimentos, é preciso lembrar que ainda não há um bacharelado específico em compliance.

Portanto, a escolha pelo profissional deve seguir requisitos de conhecimentos que tenham interface com a realidade a ser enfrentada, como a noção sobre os aspectos regulatórios relevantes ao negócio, além de treinamentos e outras certificações (veja a próxima tabela). Outras hard skills importantes são conhecimento de gerenciamento de projetos e habilidades técnicas de monitoramento, bem como fluência em práticas de feedback.

Habilidades para atuar no setor de Compliance

Entre as habilidades necessarias para a área, o peso maior recai sobre as soft skills – principalmente:

  • habilidades comunicativas e analíticas;
  • visão estratégica;
  • diplomacia;
  • criatividade para solução de problemas;
  • capacidade de identificar oportunidades de melhoria nos processos internos;
  • capacidade de influenciar comportamentos e ministrar treinamentos.

É muito importante considerar que os profissionais de compliance precisam ser capazes de criar engajamento das equipes em todos os níveis da empresa, o que demanda tanto habilidades sociais cotidianas, como específicas, como ao comunicar dados e análises à alta direção. Liderança, pró-atividade, capacidade de resolução de conflitos e postura ética são frequentemente citados também nas vagas abertas para a área.

Estruturação da equipe de Compliance: tarefas e quantidade de colabroadores

A incompatibilidade entre o rol de atribuições – como análises regulatórias, relatórios que informam a alta administração, desenvolvimento de novas políticas, procedimentos, implementação de mecanismos de controle, treinamentos, detecção e prevenção de fraudes ou riscos com fornecedores, etc. – e a quantidade de colaboradores no time pode gerar algumas situações a serem administradas.

Por exemplo, se algumas funções forem alocadas em pessoas de outras áreas, além das responsabilidades precisarem estar claras, é necessário sempre checar a existência de conflitos de interesses e estabelecer uma boa rotina de comunicação com o responsável pelo Compliance.

A realidade das equipes enxutas frente à tantas atividades de alta complexidade e responsabilidade ainda é compensada pela terceirização, como foi relatado por 35% do setor. Além disso, 71% dos entrevistados utilizam tecnologias ou ferramentas automatizadas para gerenciar o programa de Compliance – e entendemos que algumas, como o Canal de Denúncias externo, funcionam também como um ganho de inteligência na gestão, caso o fornecedor tenha operadores qualificados, elaborando categorias de dados e indicadores corretamente.

Tanto a terceirização como a contratação de ferramentas para ganho de qualidade e eficiência em Compliance devem ser pensados com muito cuidado, uma vez que impliquem o compartilhamento de informações relevantes e sensíveis da empresa.

Ao considerar a contratação de um Canal de denúncias, por exemplo, analise cuidadosamente o ambiente em que ele está hospedado e quais são as suas certificações de segurança. Verifique se há controle e histórico dos relatos, permitindo auditoria, se back ups são realizados diariamente, se o código fonte é monitorado contra falhas e, por fim, se há um centro de operação de segurança que barre tentativas de ataques.

Sem a avaliação correta, a busca por uma solução pode terminar na implementação de uma ferramenta inadequada e insegura, vulnerabilizando a empresa em outras frentes.

Perfil ético da equipe de Compliance: avaliação na atração e seleção

Tendo entendido o que faz um setor de compliance, é preciso se atentar a aspectos essenciais e de difícil avaliação na formação da equipe de Compliance: o perfil ético e as inclinações comportamentais.

O que pouco se fala é que existem metodologias para entender o perfil ético de uma pessoa, geralmente chamadas de “Testes de integridade”.

Atenção: os testes de integridade não são a mesma coisa que a checagem de histórico do candidato.

A checagem inclui a pesquisa sobre as atuações anteriores, a confirmação de titulações, o envolvimento em questões judiciais, a situação reputacional da pessoa, entre outros pontos relevantes para a vaga. Também conhecido como Background Check, é um procedimento essencial, mas é diferente da análise de integridade comportamental.

Já o teste de integridade analisa a capacidade de discernimento frente aos dilemas éticos do dia a dia, assim como a resistência no enfrentamento de pressões situacionais. Isso é feito a partir de questões que situam o comportamento do candidato em relação a indicadores cuidadosamente avaliados.

Ao final, é possível ter um panorama dos riscos que a contratação pode representar:

  • Qual o nível de tolerância daquela pessoa a situações antiéticas e condutas irregulares?
  • Qual o seu discernimento a respeito de gratificações em relações comerciais, questões de confidencialidade, manipulação de informações, etc?

A análise de integridade reduz o risco de contratar perfis predatórios – aqueles de alta flexibilidade moral e tendência a comportamento antiético. Mapeamos, na pesquisa sobre o perfil ético, a tendência de perfis suscetíveis a motivações externas no mercado de trabalho: majoritariamente há uma média flexibilidade moral (48%). 

Tatiane Araujo, consultora da Aliant focada em entrevistas de avaliação de flexibilidade moral, destaca que conhecer o perfil ético dos profissionais é fundamental para mapear os riscos ligados ao fator humano.

“Implementar essa avaliação como etapa complementar em um processo seletivo é uma forma de compreender mais profundamente o perfil do profissional que se está contratando, reunindo informações para além das esferas comportamentais e técnicas já habitualmente avaliadas em um processo de seleção.”

Ela explica que ao compreender os fatores que embasam a tomada de decisão do indivíduo em situações de dilemas éticos, bem como em quais situações ele poderia flexibilizar eticamente sua conduta, permite que as empresas não só tenham uma visão das vulnerabilidades que a pessoa pode apresentar em determinada função, mas também entender se há realmente um alinhamento cultural e de valores.

Ela explica: “quando falamos de profissionais que atuam nas áreas de Compliance, ética e controles internos, essa avaliação se torna ainda mais necessária, já que estes sãos os responsáveis por garantir a propagação de uma cultura ética e de integridade dentro da organização.”

Nesse sentido, a análise de perfil ético serve para que as empresas entendam como cada profissional lida com normas, regras e políticas, além oferecer perspectiva sobre sua propensão para descumprir procedimentos ou tomar atitudes desviantes em situações de dilemas.

Tatiana conclui que “esse tipo de avaliação permite entender se o profissional que cuidará das políticas e processos internos tem um perfil de cumprimento e de percepção ética alinhado com o da companhia.”

Considerando esse cenário e os padrões identificados no relatório sobre fraude ocupacional da ACFE, a Association of Certified Fraud Examiners, em que 85% dos profissionais que cometem fraudes têm comportamentos de risco detectáveis, a aplicação de um teste de integridade é indispensável – e tem eficácia validada em pesquisas nos últimos trinta anos.

Se a avaliação das disposições pessoais frente a dilemas éticos pode ser considerada o quarto pilar de uma boa contratação, ao formar uma equipe de compliance torna-se ainda mais decisiva.

Saiba mais sobre os testes de integridade e como usá-los no processo seletivo da sua empresa.

🔵 Teste de integridade: reduza o turnover e construa uma cultura ética através de análise da percepção moral dos candidatos

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Luara A. Stollmeier

Luara A. Stollmeier

Consultora e Pesquisadora da Aliant. Doutora pela UFMG, possui uma década de experiência em Pesquisa e Gestão de projetos, possui habilidades na coordenação de pesquisas, análise de dados e comunicação de temas complexos.

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